Carta Aberta


O ano era 2008 e eu sentia que minha vida iria desmoronar mais uma vez. Sonhos rachados e todas as minhas tentativas em vão. Ainda tentei remendar cacos por três anos. Dor, aflição, angústia, tristeza e um monte de experiências que por fora pareciam prazerosas, mas tinham como raiz essas sensações descritas.

Dois anos antes já havia tomado uma das decisões mais sérias da minha vida, romper com uma tradição religiosa familiar. Era o ano de 2006 quando disse não a toda experiência religiosa que não retratasse a verdade do meu coração. Começava a Estação do Caminho da Graça em Fortaleza. Mas minha libertação estava apenas começando, uma mais dolorida ainda estava por vir.

Em 2004 já havia decidido viver uma experiência nova de espiritualidade, mais de acordo comigo mesmo. Esse desejo, sempre foi a minha busca, apesar do termo “nova” nada tinha de novo, era a mesma sede que desde a minha infância me tomava, mas que não encontrou nos centros religiosos que passei espaço para se desenvolver.

Esse espaço só veio surgir definitivamente quando rompi laços e anunciei publicamente a minha caminhada de fé sem os rótulos anteriores. Mas como disse isso era só o começo. A minha vida pessoal estava passando por tribulações muito sérias, tão sérias que no decorrer de 3 anos de lutas não resisti e enfrentei o fim de um sonho, a destruição de um castelo.

Era final de ano de 2010 quando em meio a dores infinitas fiz um trato comigo mesmo. Não era um novo caminho de fé, era um novo caminho pessoal. Fiz um pacto de verdade da minha alma com a minha alma. Um pacto de sangue, que até hoje tenho mantido com todo esforço possível.

Começava uma jornada de encontrar meu mundo no mundo, minha forma de viver na vida. Conheceria meus limites, meus prazeres, minhas alegrias, meus desejos, meu querer e minha fé. E nesses 12 anos seguintes vim me tornando cada vez eu mesmo.

Vivi tudo que quis viver. Experimentei tudo que quis experimentar. E não consumi aquilo que não quis consumir. Era um homem em teste, e como me testei. E com isso, cresci, amadureci. No meio desses doze anos morri. E na morte fui ao inferno e de lá, Aquele que é Dono de tudo, decidiu me tirar. Uma nova vida, porém, sob a insígnia da morte. Mais um aprendizado, viver como que morto!

Pois bem, tudo isso para dizer que nesse tempo de tantas mudanças, algumas coisas sempre foram a mesma, a fé, a verdade da alma, a honra e dignidade. Coisas que jamais foram abaladas em mim, nem diminuídas, nem negociadas.

Mas nesse tempo, observei que muitos que seguiam comigo viram no meu processo de ser, uma oportunidade para mudar, mas aquilo que deveria ser bom, não se mostrou tão bem assim para alguns. Pois na tentativa de experimentarem a liberdade que me envolvia, abandonaram a fé, traíram a si mesmos, e a valores que não poderia ser negociado. Alguns perderam a honra e a dignidade. E o pior, associaram tudo ao meu nome, ou ao fato de estarem comigo ou perto de mim.

Se não fosse a minha liberdade e a vontade de ser eu mesmo acima de tudo, teria hoje uma estrutura religiosa fortíssima, pois o que percebi é que mesmo diante do ensino da Graça e da liberdade e da responsabilidade, a maioria das pessoas deseja o controle, a proibição. Não querem chamar para si a responsabilidade da vida, dessa forma recai sobre aquele que ensina a responsabilidade de todas as atitudes tomadas pelos outros.

E o que eu nunca fiz, nunca senti vontade ou que sequer passou pela minha cabeça eu vi. Alguns voltaram a religião, pois consideravam que era o único jeito de salvar suas almas e suas histórias. Outros começaram a mentir para si mesmo, e se mantinham perto de mim com uma espiritualidade maquiada, já não havia fé, mas também não havia coragem de dizer não creio. Os corajosos esbravejaram para os quatro ventos seu ateísmo ou seu suposto agnosticismo, e nisso começaram a se orgulhar, como se o fruto do meu trabalho fosse dar a eles a condição de não crer. Mas, o que isso tudo tem a ver comigo?

Algumas pessoas consideraram que seus comportamentos ou de seus parentes eram movidos pelos meus e pelos meus discursos. Atrelaram a mim a ruína de suas relações. Mas como, se o que mais fiz foi tentar salvá-los? O fato é que vi louvores virarem piadas, adoração virar cansaço, e culto virar evento social. Não queriam mais um pregador da Palavra, queriam um palestrante, um terapeuta, um humorista, ou qualquer coisa assim.

Mas tenho eu responsabilidade nisso tudo? Talvez sim, mas como ter sido diferente, pois no meu caminho de salvar a minha própria alma a única coisa que decidi entre os meus foi lhes ser transparente, honesto, sincero e escancarar até minhas vísceras?!

Meu pecado foi esquecer que a maioria das pessoas não deseja um líder humano. Precisam de ícones, de referências, de padrões morais. O problema é que quis salvar minha alma de me tornar uma coisa não humana chamada PASTOR, e quis apenas ser um homem que dentro de suas limitações cuidava daqueles que se permitiam ser cuidados por mim, um médico ferido.

E hoje, no primeiro dia de um novo ano, eu quero pedir perdão aos que erraram por minha causa, aos que se desviaram do Caminho por causa do meu caminho, aos que perderam a fé ou a negaram por não encontrarem em mim o que precisavam, aos que vacilaram na honra e na ética por não encontrarem em mim exemplo suficiente.

Saibam, nunca, nunca, nunca, foi minha intenção. Na verdade, tudo que quis foi o contrário, quis caminhar junto com todos, errando e aprendendo, mas sempre crescendo na Graça. O que aconteceu que vocês não viram isso?

Não! Não posso generalizar, parece sim que alguns entenderam, pois como fruto desse trabalho não tem só minha própria alma. Louvo a Deus por aqueles que em cruzando o caminho com o meu, melhoraram como pessoas, foram libertos do medo, do engano, da mentira e da religião hipócrita e se tornaram melhores pessoas e em tudo manifestam a glória de Deus.

Dessa forma, fazendo um balanço, sei que cometi erros no caminho por mim escolhido, mas ainda continua sendo o melhor caminho para o bem da alma. Felizes os que me ouvirem e entenderem que a única coisa que nos salva é o Evangelho que nos dá condições de sermos melhores. Não se trata de um aval para a loucura, mas da liberdade de construir o ser sem as amarras do engano.

Para melhorar ainda mais como gente e como pregador venho fazendo mudanças que não estão agradando a todos, mas julguem os motivos do não agrado. Eu não posso aceitar críticas de quem deseja de mim apenas o ator e não o homem de fé.

Em 2018 desejo continuar no processo de salvar a minha alma e continuarei pregando o Evangelho da Liberdade. Talvez minha postura não seja tão escancarada como antes, não por que desejo fingir qualquer coisa, mas para o bem da alma daqueles que em não tendo honra suficiente para assumir a própria vida, procuram em mim as justificativas de seus fracassos.

Que Deus me perdoe por todos os meus pecados e me ajude a ser o que peço desde a minha infância, ser uma pessoa que serve ao Evangelho!

Ivo Fernandes
1 de janeiro de 2018



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